quinta-feira, 23 de abril de 2009

Um exemplo a não ser seguido

Um exemplo a não ser seguido

“Os pecados da liderança são mais graves, mais hipócritas e mais danosos. Mais graves porque o líder peca contra o maior conhecimento. Mais hipócrita porque o líder denúncia o pecado em público e o comete em secreto. E mais danosos porque o líder quando cai sempre conduz outros a queda”
(Richard Baxter, século XVII).

A família de Eli é um exemplo de uma família que tinha tudo para dar certo, mas desintegrou-se. Eli era um homem respeitadíssimo nos seus dias. Era sacerdote e juiz de Israel. Ocupava duas posições da mais alta relevância. Como sacerdote ele era o líder espiritual do seu povo. Como juiz ele era o líder político da nação. Seus filhos tinham tudo para ser uma benção. Contudo, a Bíblia diz que eles eram uma maldição.
Esse homem foi um sucesso no seu trabalho, mas uma tragédia como pai. Esse homem era um colosso como líder de Israel, mas negligente com suas principais ovelhas – sua própria família. E há algo muito importante que deve ser examinado na vida de Eli. Ao nos depararmos com as duas severas admoestações que Deus faz ao sacerdote, o SENHOR não está advertindo-o por algo que ele tenha feito. Antes, Deus está exortando-o por algo que ele não fez (2:29; 3:13). Assim sendo, pode-se concluir que o pecado de Eli era a omissão.

Nós daremos conta diante de Deus não apenas por aquilo que fazemos, mas, também por aquilo que deixamos de fazer. O apóstolo Tiago nos advertiu: “Aquele, pois, que sabe fazer o bem e não o fez, comete pecado” (Tg 4:17). Portanto, quando você sabe da necessidade de um irmão e, por conseguinte, tendo condições de sanar o problema do referido irmão, você se omite, tal postura configura um pecado. Outro texto que merece nossa atenção diz respeito a Mateus 25:14-30. Na parábola dos talentos, qual o motivo da ira do SENHOR sobre aquele que enterrou o seu talento? Ele fez alguma coisa? O contrário! A ira do SENHOR justifica-se exatamente porque ele deixou de fazer. Quando você tem um dom dado por Deus (seja cantar, servir, contribuir, etc.) e você não o usa para a glória de Deus, nisso você está pecando.
O padre Antônio Vieira, um dos maiores paladinos da evangelização no Brasil, disse que “omissão é o pecado que se faz não fazendo”. No direito, omissão é a conduta pela qual uma pessoa não faz algo a que seria obrigada a fazer dada a circunstância. No direito Penal, a omissão constitui um crime passivo de pena. (ex.: omissão de socorro). Se na esfera humana a omissão representa um crime, imagine o que ela representa na esfera espiritual. Se para os homens a omissão é algo inaceitável, o que dirá para Deus.
A história de Eli ganha fôlego em muitos lares evangélicos. É notório o drama que muitos pais cristãos enfrentam com seus filhos. Enquanto eles estão no templo, os filhos estão no mundo. Enquanto os pais buscam a Deus, os filhos buscam a satisfação de seus próprios prazeres nos banquetes promovidos por satanás. Os números confirmam ainda mais essa realidade. Uma pesquisa realizada recentemente no CAJE constatou que 70% dos jovens e adolescentes que estão ali cumprindo medidas sócio-educativas são oriundos de lares cristãos. Nesse sentido, a vida de Eli torna-se um modelo de pai a não ser seguido. A Bíblia está repleta de exemplos. Exemplos bons e maus. Exemplos a serem seguidos e exemplos a serem rejeitados. Assim, a vida de Eli torna-se o modelo de um pai que não devemos ser.

1 – Eli cuidava dos outros, mas não cuidava da sua própria família
“Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente” (I Tm 5:8).
Eli era um especialista em resolver problemas. Os dois cargos que ele exercia fez dele um perito nessa área. Como juiz, ele se ocupava em resolver litígios, brigas e demandas sociais. Como sacerdote, ele se ocupava em resolver problemas de outra esfera, ou seja, problemas da ordem espiritual. Assim, ele era um homem que sabia exatamente o caminho para a solução. Afinal, seu dia inteiro era dedicado a cuidar dos interesses de outras pessoas. Entretanto, Eli foi incapaz de resolver o maior de todos os problemas. Enquanto ele cuidava dos outros, a sua família foi esquecida. Enquanto todas as suas energias eram dispensadas em resolver problemas alheios, um enorme problema eclodiu no seu lar. O sacerdote Eli pastoreava todos, menos sua própria família.
A crise vivida por muitos adolescentes justifica-se porque ele passou a infância inteira acreditando que o pai era um herói e quando chegou à idade da razão descobriu que o pai não era nada daquilo que ele imaginava ser. Você precisa continuar sendo um herói para o seu filho. O seu filho, mesmo após crescer, precisa continuar vendo em você um referencial de vida. Hoje há uma crise de referenciais. Inúmeros jovens ou mesmo adolescentes quando são indagados acerca de casamento, prontamente, respondem: “Eu não quero casar para ser infeliz como os meus pais!”. Essa é uma triste realidade. A própria casa tornou-se uma referência negativa.
O contrário também é verdadeiro. Conheci uma moça que iria se casar e, por conta disso, sua mãe havia se disposto a dar-lhe uma série de conselhos e recomendações. Ao final da conversa, após ouvir atentamente cada palavra que sua mãe lhe dissera, a moça disse: “Mãe, se eu for pelo menos metade da mulher que a senhor foi, tenho certeza que minha felicidade está garantida!”. Aquela senhora era um modelo para sua filha. Era mais que uma mãe, era um exemplo de esposa, de educadora, de conciliadora e, sobretudo, um exemplo de mulher.
O maior presente que você pode dar ao seu filho é amar a mãe dele. Não há nada que afete mais significativamente uma criança do que um ambiente permeado por amor e afeto.

2 – Eli era famoso fora dos portões, mas não tinha autoridade dentro de casa
Era admirado pelas pessoas de fora, mas não era admirado pelos seus filhos. Era um líder descomunal no seu trabalho, mas alguém sem nenhum prestígio dentro de casa.
Essa era a mesma frustração vivida pelo grande general de guerra Naamã. Assim a Bíblia registra: “Naamã, comandante do exército do rei da Síria, era grande homem, diante do seu senhor e de muito conceito, porque por ele o SENHOR dava vitória à Síria; era ele herói de guerra, porém leproso” (II Reis 5:1). Na rua Naamã era visto como um guerreiro vencedor, vestindo a sua indumentária de herói, uma armadura típica de um general. Alguém imponente, respeitado e admirado pelos de fora. Mas dentro de casa, quando tirava a sua capa, despido de sua armadura, não passava de um leproso.


3 – Eli havia se acostumado com o sagrado

“E, tu, por que honras a teus filhos mais do que a mim, para tu e eles vos engordardes das melhores de todas as ofertas do meu povo de Israel?” (2:29).
Para entendermos melhor o significado desse texto, é preciso que recorramos ao funcionamento do serviço prestado pelo sacerdote ao povo. Primeiramente, devemos considerar que os sacerdotes viviam do serviço sacerdotal. Assim, parte das ofertas trazidas pelo povo eram destinadas a subsistência dos próprios sacerdotes. Entretanto, a Bíblia diz que os filhos de Eli haviam ignorado essa ordenança e estavam profanando o altar do SENHOR, pois eles se apropriavam daquilo que não era deles, mas do SENHOR (2:12-17). E por que eles faziam isso? Diz a Bíblia que eles “não se importavam com o SENHOR” (v. 12). Em um vocabulário mais popular, eles não davam a mínima para Deus.
Há ainda um texto que devemos considerar. O profeta Oséias foi levantado por Deus para advertir o povo acerca da sua transgressão. Contudo, há uma forte admoestação de Deus para os seus sacerdotes. Senão, vejamos: “O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento. Porque tu, sacerdote, rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de mim; visto que esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de teus filhos. Quanto mais estes se multiplicaram, tanto mais contra mim pecara; eu mudarei a sua honra em vergonha. Alimenta-se do pecado do meu povo e da maldade dele têm desejo ardente. Por isso, como é o povo, assim é o sacerdote; castigá-lo-ei pelo seu procedimento e lhe darei o pago das suas obras” (Oséias 4:6-9).
A tendência de muitos cristãos é parar na primeira sentença do versículo 6. Entretanto, a chave hermenêutica para entendermos o real significado de tal afirmação está nos versos seguintes. Por que o povo estava sendo destruído? A resposta é clara: por falta de conhecimento. Outra pergunta deve ser feita: Qual a única maneira de se remir um pecado no Antigo Testamento? Através do sacrifício de animais, ou seja, através de uma oferta pelo pecado. Por isso, o sacerdote era um grande interessado no pecado do povo, pois quanto mais o povo pecava, mais sacrifícios haveria. E, havendo mais sacrifícios, mais ele ganhava. Essa era a dinâmica que havia se instituído no templo na época do profeta Oséias. Por isso Deus diz: “Alimentam-se do pecado do meu povo”. O pecado havia se tornado uma fonte de lucro.
Esse era exatamente o drama que envolvia Hofni e Finéias. O pecado do povo havia se tornado a fonte de lucro para eles. A Bíblia registra que o próprio Deus disse a Samuel que eles “se fizeram execráveis” (v. 13). A palavra execrável é sinônima da palavra abominável. Perderam completamente a sensibilidade. Suas mentes estavam cauterizadas. Estavam no templo, mas estavam desviados. Estavam diante do altar, mas com o coração longe de Deus. Estavam fazendo a obra de Deus, mas mergulhados na lama do pecado. Para Deus, ser é mais importante do que fazer. Deus não está preocupado com o que você faz, mas, sobretudo, com quem você é.
Não há perigo maior do que esse! Acostumarmo-nos com as coisas de Deus. Vir ao culto já não é mais empolgante, ler a Bíblia já não é mais empolgante, orar já não é mais empolgante. Banalização daquilo que é santo. É a própria secularização do divino.

4 – Eli aceitou passivamente a decretação da derrota em sua família.
“Então, Samuel lhe referiu tudo e nada lhe encobriu. E disse Eli: É o SENHOR; faça o que bem lhe aprouver” (3:18). A Bíblia na Linguagem de Hoje traduz assim: “Faça Deus o que achar melhor”.
Essa frase proferida pelo sacerdote Eli indica sua rendição. Sua omissão o levou a passividade – aceitou a decretação da derrota dentro de sua casa. O juízo sentenciado por Deus deveria tê-lo conduzido às lágrimas. Entretanto, ele aceita a derrota. Eli aceitou passivamente a decretação da derrota sobre a sua casa. Ele não reagiu. Ele não clamou por misericórdia. Ele não orou. Ele, simplesmente, entregou os pontos.
Não há nada mais triste do que isso. Ver um pai desistindo dos seus filhos é algo deplorável. O silêncio de Eli dentro de casa foi a sua própria condenação. Luther King, em um de seus discursos, afirmou: “O que me preocupa não é o barulho dos violentos e sim o silêncio dos justos”. Eli se calou quando deveria ter gritado. Ele ficou parado quando deveria ter agido. Ele se rende quando deveria ter lutado pela sua família e salvação de seus filhos.
Não entregue os pontos! Não desista! Não abra mão da sua família! Você não gerou filhos para a morte. Você não gerou filhos para o cativeiro. Ore, lute, chore e jejue pela salvação dos seus filhos.

Conclusão
Um dos mais conhecidos pregadores da Inglaterra foi Richard Baxter. Quando jovem foi chamado a pastorear uma grande igreja, cujos membros eram ricos e instruídos. Achou-os, porém, frios e carnais. Por isto, ficou desapontado e deixou-se levar pelo desânimo. No auge da crise, declarou: “O único meio de salvar a Igreja é estabelecer a religião nos lares, e levantar o altar familiar”.
Passou três anos visitando casas e estabelecendo o culto doméstico. Seus esforços foram coroados com êxito. E, assim, o culto doméstico serviu de base a um movimento que trouxe à Igreja milhares de pecadores.
Essa é realmente a maior necessidade da Igreja contemporânea. Erguer o altar dentro do ambiente familiar é uma necessidade real e urgente.
Rev. Daniel Sampaio Mota

quinta-feira, 9 de abril de 2009

As últimas lições do discipulado

As últimas lições do discipulado
João 13:1-17

Introdução
O que você faria se soubesse que morreria amanhã? O que você falaria para as pessoas que te cercam se soubesse que aquelas seriam suas últimas palavras? Quais seriam seus atos se soubesse que seriam seus últimos gestos? Se você fosse um pregador, qual seria o seu último sermão? Essa era exatamente a condição de Jesus. Diz a Bíblia que “sabendo Jesus que era chegada a sua hora de passar deste mundo para o Pai...” (v.1). Sendo Deus e gozando de atributos divinos como a onisciência, Jesus sabia exatamente o que o aguardava ainda aquela noite. Ele sabia que horas depois seria traído, entregue aos principais sacerdotes e abandonado pelos seus discípulos. Por isso, aquelas eram horas preciosas. Com certeza muito havia a ser dito. Muitas palavras a serem proferidas. Muitos conselhos a serem dados. Inúmeras recomendações a serem feitas. Entretanto, naquela noite memorável, Jesus abre mão do discurso e lança mão do exemplo. Ele não fala, ele age. Ele não prega um sermão, ele vive a pregação.
É muito sugestivo o texto iniciar dizendo “Ora, antes da Festa da Páscoa...” (v. 1), porque a Páscoa torna-se o cenário sobre o qual esse evento acontece. Isso não é por acaso. Não se trata de uma data acidental. Pelo contrário, todas as coisas obedeciam ao relógio de Deus. A palavra páscoa significa passagem. A instituição da páscoa remonta a saída do povo do Egito para a Terra Prometida. Nesse sentido, a páscoa simbolizava a passagem do povo de uma condição de escravidão para a liberdade. Assim sendo, a páscoa do Antigo Testamento e do Novo Testamento tem o mesmo sentido, mas dimensões diferentes. No Antigo Testamento, a Páscoa simbolizava a libertação física do povo, ou seja, a escravidão e o jugo a que os hebreus estavam submetidos pelos egípcios havia terminado. No Novo Testamento, a páscoa também simboliza a libertação. Contudo, agora, com uma dimensão espiritual. Aquele que era escravo do pecado, sentenciado ao juízo divino, agora está liberto através do sacrifício vicário de Jesus.
O ministério terreno de Jesus durou três. E, neste interstício, os discípulos tiveram a grande oportunidade de conviver diariamente com o Mestre. Três anos ouvindo suas pregações, preleções e estudos bíblicos. Este foi, com certeza, o maior seminário teológico já fundado na história do cristianismo. Esse seminário era composto de apenas doze alunos e um único professor – o próprio Deus, Jesus de Nazaré. Os discípulos testemunharam diversos milagres: curas, libertações e até ressurreições.
Durante esse período, os apóstolos participaram da intimidade de Jesus. Entretanto, o texto sugerido nos mostra que o período de formação estava chegando ao fim. Após três anos de muito aprendizado, os seminaristas estavam prestes à ordenação. O evento narrado pelo evangelista João remonta a noite de quinta-feira, data em que Jesus seria entregue aos principais sacerdotes. Portanto, o texto relata os últimos momentos de Jesus com os seus discípulos. E é exatamente para essa noite que Jesus havia reservado as últimas lições do discipulado. Passemos a examinar as últimas lições de Jesus:

I – Lição do Amor (v. 1)
O texto diz que “tendo Jesus amado os seus, amou-os até o fim”. É um amor sem limites, um amor levado às últimas conseqüências. O escritor Philip Yancey afirma que Deus se assemelha a um pai cego de amor por seu filho, alguém disposto a dar sua própria vida. É um amor sacrificial. Max Lucado, certa vez, lançou a seguinte pergunta: “Sabe por que Jesus morreu na cruz?” Ele mesmo responde: “Porque Deus não se imaginava passar a eternidade sem você!”. Assim, Jesus transmite aos seus aspirantes ao ministério pastoral que é absolutamente impossível ser pastor sem amar. O amor é uma condição imprescindível para o exercício do ministério. O jovem pastor batista Martin Luther King disse: “Aprendemos a nadar como os peixes; a voar como os pássaros; mas, ainda não aprendemos a amar o próximo.
Outro ponto que merece destaque diz respeito ao amor incondicional de Jesus. Somos amados não pelo que fazemos ou deixamos de fazer. Não é um amor baseado numa relação de troca ou barganha. Philip Yancey diz que “não há nada que eu possa fazer para Deus me amar mais; não há nada que eu possa fazer para Deus me amar menos”. Não há nada nesse mundo que abale o amor de Jesus. Jesus amou todos, inclusive Judas.
Judas era um homem acima de qualquer suspeita. Ao contrário do que se pensa, ela era um homem de extrema respeitabilidade no colégio apostólico. Judas era o único discípulo de Jesus que era da Judéia. Todos os outros eram da Galiléia. Assim, Judas gozava de um status mais elevado, porque os judeus provenientes da Galiléia eram considerados impuros, enquanto os judeus da Judéia eram considerados mais devotos, consagrados e justos. A Galiléia era tida como uma terra imunda, porque estava cheia de gentios. Outro aspecto a ser considerado acerca de Judas Iscariotes diz respeito a posição que ocupava dentre os apóstolos. Ele era o único que tinha um cargo e, por sinal, um cargo de confiança. Ele era o tesoureiro do grupo. O único cargo disponível era ocupado por ele.
O texto diz que Jesus lavou os pés de todos os discípulos, inclusive os pés de Judas. Jesus está lavando os pés daquele que, naquela mesma noite, iria traí-lo. Judas era considerado amigo de Jesus. A Bíblia diz que quando Judas se aproximou de Jesus no Getsêmani acompanhado dos guardas e fariseus que prenderiam o prenderiam, Jesus lhe perguntou: “Amigo, para que vieste?” (Mt. 26:50). Max Lucado diz que “a traição é um ato que só um amigo pode cometer”. O inimigo não pode trair porque, para haja traição, é preciso que aconteça entre duas pessoas próximas, amigas e que guardam uma relação de confiança. Jesus nunca considerou Judas como seu inimigo. Pelo contrário, Judas fazia parte do seleto grupo de amigos de Jesus – os 12 discípulos.

II – Lição de Humildade (v. 4-5).
A Bíblia diz que o primeiro ato de Jesus foi “tirar a sua vestimenta” (v. 4). Por que Jesus se despiu da sua roupa? Porque a roupa diz muito acerca de quem nós somos. Há uma máxima contemporânea que diz “você é aquilo que você veste”. A roupa identifica a posição ou mesmo a função que alguém exerce na sociedade. Através da roupa sabemos, claramente, se a pessoa é rica ou pobre. Se é alguém importante ou uma pessoa simples. Isso se deve porque o vestuário indica status. É exatamente por isso que muitas pessoas estão dispostas a pagar R$300,00 reais numa calça jeans. Não se trata daquilo que ela faz (vestir), porque isso qualquer calça faz, mas sim o que ela representa. A roupa é um símbolo de poder. A roupa é um estereótipo que não tem apenas a função de vestir, mas, sobretudo, de caracterizar. A própria vestimenta de Jesus era uma veste utilizada tipicamente por rabinos e mestres da Lei. Era uma roupa valiosa, por isso, após a sua crucificação os guardas lançaram sortes para decidir sobre quem ficaria com suas vestes (Lc 23:34).
Por que Jesus fez isso? Uma excelente maneira de aprendermos acerca de um tema é esgotarmos o que a Bíblia diz sobre determinado assunto. Nesse sentido, é interessante notar que esse evento de lavar os pés é narrado apenas pelo evangelista João. Entretanto, a última ceia é narrada pelos outros evangelistas. O evangelista Lucas, por exemplo, narra um evento muito intrigante que sucedeu durante a última ceia. O capítulo 22 de Lucas é um texto paralelo ao capítulo 13 do Evangelho de João. Portanto, os eventos que acontecem em Lucas 22 são os mesmos que acontecem em João 13. Assim sendo, Lucas narra que durante a ceia os discípulos começaram a debater entre si qual deles seria o maior (Lc 22:24). Alguns comentaristas dizem que foi exatamente no meio dessa discussão que Jesus se levanta e se despoja de sua túnica, ensinando aos seus discípulos o verdadeiro sentido de grandeza no Reino de Deus. Bill Hybels afirma que, para ser grande no Reino de Deus, o cristão deve crescer para baixo. É um crescimento que nos leva a pequenez. No Reino de Deus ninguém sobe degraus rumo à ascensão. A ascensão é a diminuição.
O texto afirma que Jesus tomou uma toalha, deitou água na bacia e passou a lavar os pés dos discípulos. A atitude de Jesus era uma prática comum no Oriente Médio. As ruas não eram pavimentadas e, por isso, as pessoas sujavam muito os seus pés ao caminharem pelas ruas da cidade. Além do mais, o calçado utilizado por todos eram sandálias abertas que propiciavam o contato direto dos pés com a poeira. Assim, quando alguém oferecia um banquete com o intuito de receber convidados importantes, colocava um escravo na porta da entrada para lavar os pés daqueles que chegassem para a refeição. Como pode se observar, Jesus assume uma postura de um escravo.
Lembremo-nos ainda que Jesus é Deus, e, como tal, encontra-se despido de sua glória, envolto em uma toalha, de joelhos, lavando os pés de pecadores. Agostinho dizia que a qualidade indispensável para um verdadeiro cristão é a humildade. Jesus ensina aos seus seminaristas que o exercício do ministério pastoral necessita de pessoas humildes. A palavra humildade é tapeinós (grego), de onde se origina a palavra tapete. Ou seja, a raiz da palavra humildade sugere alguém que está disposto a ser pisado e humilhado. É bom recordar que, anos antes desse evento, o profeta João Batista havia dito que ele não era digno nem mesmo de desatar as sandálias de Jesus (Mc 1:7). No entanto, Jesus, o Deus encarnado, ajoelha-se diante de seus discípulos e, não apenas desata as correias de suas sandálias, mas, ainda, lava os seus pés.

III – Lição de Serviço (v. 14-16).
Jesus mostra aos seus seminaristas que ser pastor é, antes de tudo, ser um servo. Ele conclama os seus apóstolos a se despirem da indumentária eclesiástica e assumirem a forma de um serviçal. Como filhos de Deus, somos chamados a frutificar. O grande pregador e avivalista do século XIX, Dwight L. Moddy, afirmou com muita propriedade: “Ore, como se tudo dependesse de Deus; trabalhe, como se tudo dependesse de você!”. O próprio Moody, ainda, afirmou: “Ser cristão não exige muito de uma pessoa, exige tudo”. O SENHOR nos chama ao serviço e às boas obras.
Conta-se que, certa vez, um jovem viu o árduo trabalho feito pela Madre Tereza de Calcutá junto aos leprosos. Um trabalho árduo, difícil e sem nenhum prestígio nem reconhecimento. Ao presenciar o trabalho da devota freira, ele exclamou: “Eu não faria esse trabalho nem por um milhão de dólares!”. A freira respondeu: “Eu também não!”. Ele perguntou: “Então, por que a senhora o faz?” Madre Tereza, prontamente, lhe respondeu: “Por amor!”.
É curioso saber que o último sermão do grande expositor bíblico John Stott, em 17 de julho de 2007, na Inglaterra, teve o seguinte tema “Tornando-nos mais semelhantes a Cristo”. E no decorrer de sua mensagem, um dos textos examinado foi João13. Assim Jonh Stott discorre: “Quero convidá-los a subir comigo ao cenáculo onde Jesus passou sua última noite com os discípulos. ‘Tirou a vestimenta de cima e, tomando uma toalha, cingiu-se com ela. Depois, deitou água na bacia e passou a lavar os pés aos discípulos e a enxugar-lhos com a toalha com que estava cingido. Ao terminar, retornou ao seu lugar e disse-lhes: Ora, se eu, sendo o SENHOR e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Porque eu vos dei o exemplo’. Note-se a palavra – ‘para que, como eu vos fiz, façais vós também’.
Ensinar através do exemplo não é a melhor maneira de influenciar as pessoas e inculcar fortemente os princípios ensinados. É a única. Jesus utilizou diversas formas de ensino para treinar seus discípulos: pregação, parábolas, estudos, atos. Entretanto, aqui ele se utiliza do melhor e mais eficaz método de ensino: o exemplo. Jesus não nos pediu nada daquilo que ele mesmo não tenha feito. O serviço da Igreja tem como paradigma o próprio ministério servil de seu Mestre. Assim, naquela noite de quinta-feira, antes de se despedir dos discípulos, Jesus traz a eles lições preciosas. “Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também” (v. 15). A atitude de Jesus é apenas um exemplo. Cabe a nós perpetuarmos os seus ensinamentos.


Rev. Daniel Sampaio Mota